Meu
Piquititico morreu. Eu não vi nada, só fiquei sabendo uma semana depois. Não vi
ele morto, não vi ele sendo enterrado, não vi nada. A última lembrança que
tenho é de estar com ele dormindo no meu colo. Tão pequenininho, tão bonitinho.
Meu avô
paraibano é que tinha esse apelido, foi dele que copiei. Filho de mãe índia e
pai espanhol, era baixinho e muito brabo. Cabeludo também, cabelo preto, liso e
duro. Diz que só não tinha cabelo em volta dos olhos, na palma das mãos e na
planta dos pés. Se chamava Teodorico, mas ninguém dizia “seu Teodorico”. Era “seu
Piquititico” mesmo. Minha bisavó foi quem pôs o apelido, por isso ele não se zangava e até gostava de ser chamado assim.
Pois o meu
Piquititico era tal e qual: ainda um nenê e já brabinho, com aquelas penugenzinhas pretas crescendo e se espalhando.
Pois então.
Eu estava no banco de trás com ele dormindo no meu colo. Meu marido ia dirigindo. Aí
veio o caminhão desgovernado e bateu. Por detrás. Meu marido se machucou, mas
não muito. Eu e Piquititico batemos a cabeça. Minha cabeça é dura, não quebrou,
só sacudiu o cérebro e me deixou inconsciente. Mas ele, coitado, com os ossos ainda molinhos, não teve escapatória.
Acordei no hospital uma semana depois do desastre, e só queria saber dele. Uma coisa que não
entendo até hoje: quando me contaram, a minha preocupação não era ele
ter morrido, mas sim ele ter sofrido na hora. Me disseram que não. Era
impossível ele ter sentido dor porque a batida foi tão forte que não deu tempo
de nada. Com certeza morreu dormindo e foi direto para o céu.
Isso já faz
um tempo e ainda não entendi o que aconteceu, as pecinhas ainda não se encaixaram nos seus lugares. Continuo mais admirada do que triste com tudo isso.
Sei que
posso ter outros, mas nenhum será como o Piquititico. Às vezes pego o seu travesseirinho e fico abraçando, fazendo de conta que é ele. Escondido do
meu marido, para ele não achar que eu enlouqueci. Ou pior: ficar com dó de mim.
Meu avô
Teodorico é que deve estar contente a estas horas. Certeza de que está se
divertindo muito lá no céu, brincando com o bisnetinho que ainda não conhecia.
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