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sábado, 20 de setembro de 2014

Futebol de várzea

 Trecho do livro Os meninos da Rua Beto 

- - - Uma crônica dos anos setentas - - -

Antigamente a prática do futebol era mais acessível do que é hoje, porque em cada bairro havia pelo menos uns dois terrenos baldios com tamanho suficiente para abrigar o campo e a torcida.

Os clubes eram bem organizados e contavam com vários times: Dente de Leite, Juvenil, dos Veteranos, e os dois principais: o Primeiro Quadro, que era o titular, e o Segundo Quadro, composto pelos aspirantes e reservas. Nos domingos de manhã havia jogo entre os Dentes de Leite, depois os outros, culminando pelos principais.

Durante os campeonatos as partidas se distribuíam por vários bairros. Não eram numerosos os campos que dispunham de arquibancadas, mas a torcida não se importava se às vezes precisava assistir em pé ou sentada num barranco (ou mesmo sobre galhos de árvores).

Essa mania de futebol irritava as esposas, porque todo domingo de manhã os maridos saíam levando consigo os "filhos homens", dizendo que voltavam para o almoço, mas só apareciam lá pelas três ou quatro horas da tarde.

É que depois da vitória vinha a comemoração! E se o time não tivesse vencido era preciso desabafar as mágoas, espairecer com os amigos... Por um motivo ou por outro sempre acabavam indo para o bar em vez de voltarem para casa, preferindo tomar cerveja, comer linguiça frita e ovo cozido de casca amarela em lugar do caprichado macarrão com molho de tomate, polvilhado de queijo duro ralado.

Numa das tais manhãs de domingo estava se realizando um amistoso lá na Vila Formosa, periferia da Zona Leste de São Paulo. De repente, por alguma razão, os jogadores se desentenderam e começou uma briga feia entre os dois times.

Não se sabe se foi alguém que chamou a polícia ou se esta vinha passando e viu a desordem. O fato é que os policiais separaram a briga, apreenderam uma amostra dos que estavam batendo e uma amostra dos que estavam apanhando, e mandaram que entrassem na viatura, uma perua Veraneio pintada de preto e branco.

Como o bate-boca não parasse, resolveram levar os dois times completos para a delegacia, e pediram reforços. Chegaram outras "barcas" e todo mundo foi devidamente acomodado.

Estavam naquele vai-não-vai quando chega ao campinho o pai de um dos goleiros e vê o filho em uma das viaturas, no meio daquele monte de gente.

--- Ó Zezinho, que estás a fazer aí? Já pra casa que a comida está na mesa!

Como o filho não obedecesse, o homem foi ficando cada vez mais irritado.

--- Não obedeces teu pai, ó menino? Já pra casa que o almoço está a esfriar. Tua mãe vai se abespinhar com a tua demora!

O Zezinho bem que tentou explicar a situação ao pai, mas este se recusava a aceitar os fatos. Depois de brigar muito com o filho, resolveu tirar satisfação com os guardas. E tanto falou, e tanto discutiu, que eles não suportaram mais e resolveram soltar o Zezinho só para ficarem livres daquela criatura impossível.

Aí o pessoal que estava na mesma viatura não se conformou. Se ele podia ser solto por que os demais não podiam também? Que diferença de tratamento era aquela? Por acaso eles também não precisavam almoçar?

Protestaram, argumentaram, atazanaram, até que os policiais resolveram soltá-los.

Uma onda de revolta atingiu os outros detidos! Então havia desigualdade entre as viaturas? Que injustiça absurda! Os direitos não eram iguais? Ou todo mundo ou ninguém! Ora, onde é que já se viu?

Mais bate-boca, mais protestos, até que a polícia não aguentou mais. Abriu todas as portas e mandou que fossem embora. 

Acabou-se o jogo, acabou-se a briga, acabou-se a detenção. 

Todo mundo (até a polícia) foi pra casa almoçar.  

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