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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Amanda e sua mãe

           Amanda morreu não pela doença, mas porque não precisava viver. Não tinha nada o que fazer neste mundo. Senti isso, de alguma forma, desde que ela nasceu.
           Jamais sorria, só olhava. Com aqueles olhos grandes e cinzentos que pareciam penetrar tudo.
           Aprendeu tarde a falar. Na verdade, nem sei quando aprendeu. Um dia, com quase dois anos, simplesmente falou. Alguém lhe fez uma pergunta esperando ouvir aquela pronúncia engraçada das crianças, mas ela respondeu perfeitamente, articulando bem as palavras e o raciocínio.
           Quase caí pra trás. Quem lhe ensinou? Eu, com certeza, não fui. Pai não tinha para lhe ensinar nada. Então como? Só posso imaginar que foi pela observação, prestando atenção nas conversas.
           Isso aumentou um pouco a sensação de desconforto que me causava. Eu sentia que ela me observava e analisava, que sabia quando eu estava mentindo. Mesmo naquela idade, quase um bebê.
           Nunca me chamou de mãe. Sempre que precisava falar comigo, me chamava pelo nome. Nunca perguntou pelo pai. Nunca me pediu nada. Só vivia. E observava. Era assustador.
           Quando foi para a escola, as professoras diziam que ela era quieta e não fazia perguntas. Em compensação, entendia tudo, o que ficava demonstrado pela perfeição dos trabalhos e das lições. Que aliás nunca ajudei a fazer. Nunca me pediu, nunca me ofereci. Se tivesse pedido alguma vez, eu teria ajudado, mas parecia não precisar de nada, então deixei de lado essa preocupação.
           Engraçado é que na escola ela era querida pelos colegas. Interagia bem, brincava e ensinava as coisas que os outros achavam difícil, como aritmética. Quando me contaram, nem acreditei. Amanda brincando e conversando com as outras crianças? Nem dava pra imaginar.
           Então ficou doente. Ninguém lhe falou da gravidade da doença, mas ela sabia. Porque sabia tudo. Já nasceu sabendo tudo.
           Era horrível ficar perto dela nessa época porque ela me observava com os grandes olhos cinzentos e me analisava e obviamente já tinha adivinhado que a sua futura ausência seria um alívio para mim. É terrível dizer isso, mas era verdade.
           Horas antes da sua morte, quem fez uma adivinhação fui eu. Ou assim pensei.
           Pelo jeito que me olhava achei que ia me fazer uma pergunta. Que ia perguntar pelo pai. Fiquei nervosa, não queria falar do pai dela, nem mesmo naquele momento extremo.
           Então me chamou:
           “Alzira.”
           Me preparei para a pergunta.
           “Onde está a minha mãe?”
Imagem: http://sigulu.blog.uol.com.br

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