Isto aconteceu há muito tempo, quando eu era criança, num lugar
distante de tudo.
A vizinha deu à luz em sua casa, e a criança morreu.
Ao chegarmos para o velório, o bebê ainda estava na cama ao lado da
mãe. Um menino bonito que parecia dormir. Tinha o semblante de alguém que
adormecera muito cansado, depois de uma labuta penosa.
A mãe aparentava abatimento físico, mas estava sorridente. Conversava
com uma moça e de vez em quando as duas davam risadas.
O anjinho ali, dormindo o seu sono eterno, e a mãe toda contente.
Na hora do batismo a moça risonha pegou uma vela acesa e aproximou-se
do corpinho inerte.
― Eu te batizo em nome do Pai, do Filho...
Um acesso de riso a interrompeu. Esforçou-se para ficar séria e
retomou:
― Eu te batizo em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo.
Não me recordo se algum nome foi atribuído ao bebê. Não sei se o
enterraram em um cemitério ou ali mesmo no quintal, ao pé do abacateiro.
Desde então imagino, pregada no tronco da árvore, uma lápide feita de
folha de caderno, escrita com lápis de cor e letra de criança:
Anjinho,
foi melhor assim.
http://heyartur.blogspot.com.br/
2 comentários:
Impactante esse conto!
Sabe o que é pior, Ivan? É que se trata de fato real... :( Nunca esqueci porque, criança que era, fiquei chocada. Como entender tal reação por parte de uma mãe que acaba de perder um filho? Na idade adulta aprende-se que o ser humano é capaz de tudo, mas na infância ainda predominam as ilusões e esperanças. (Obrigada pela visita.)
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